Governo do Estado do Rio Grande do Sul
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MOÇÃO DE REPÚDIO

Publicação:

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MOÇÃO - Foto: CES/RS

Assunto: Termo de Autocomposição firmado entre Ministério Público Estadual e Governo do Estado do Rio Grande do Sul

 

A Mesa Diretora do Conselho Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul – CES/RS,ad referendum de seu Plenário,no uso de suas competências e atribuições conferidas pelas Leis Federais nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, e nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, e pela Lei Estadual nº 10.097, de 31 de janeiro de 1994, alterada pela Lei Estadual n. 15.971,de 07 de julho de 2023, vem pelo presente manifestar o quanto segue:

 Considerando que incumbe ao Ministério Público, na forma do art. 127 da Constituição Federal, a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, bem como promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social;

 Considerando que a Recomendação nº 54/2017 (que dispõe sobre a Política Nacional de Fomento à Atuação Resolutiva do Ministério Público Brasileiro) prevê, em seu art. lº, que atuação resolutiva e' aquela por meio da qual o membro, no âmbito de suas atribuições contribui decisivamente para prevenir ou solucionar de modo efetivo, o conflito, problema ou a controvérsia envolvendo a concretização de direitos e interesses para cuja defesa e proteção é legitimado o Ministério Público bem como para prevenir,  inibir ou reparar adequadamente a lesão ou ameaça a esses direito,  interesses e efetivar as sanções aplicadas judicialmente em face dos correspondentes ilícitos, assegurando-lhes a máxima efetividade possível por meio do uso regular dos instrumentos jurídicos que lhe são disponibilizados para a resolução extrajudicial ou judicial dessas situações;

 Considerando que a Recomendação de Caráter Geral nº 02/2018, da Corregedoria Nacional do Ministério Público, no seu art. lº, inc. VI, estabelece que os membros do Ministério Público devem concretizar atuação preventiva, amparada no compromisso com ganhos de efetividade na atuação institucional, voltada notadamente para evitar a prática, a continuidade e a repetição de ilícitos ou para promover a sua remoção, bem como que, para aferição da resolutividade material serão avaliados os impactos sociais e a efetividade social da atuação;

 Considerando que o Governo do Estado do Rio Grande do Sul nunca cumpriu a Emenda Constitucional n, 29/2000, nem os termos da Lei Complementar n. 141/2012, que a regulamenta, que exigem o investimento na saúde pública pelos Entes estaduais de no mínimo 12% de sua receita líquida, haja vista o cômputo de ações e serviços públicos de saúde que não poderiam ser computados, por impositivo legal;

 Considerando que, no âmbito do Núcleo Permanente de Autocomposição -  MEDIAR/RS, regulamentado através do Provimento 11/2016-PGJ, foi instaurado procedimento administrativo, no qual se chegou à SOLUÇÃO CONSENSUAL entre o Ministério Público e o Governo do Estado, a fim de postergar o cumprimento da Lei Complementar n. 141/20212;

 Considerando a cláusula primeira do termo, que prevê o cumprimento da legislação com a conclusão do investimento mínimo em saúde somente no ano de 2030, sem computar parcelas controversas, conforme tabela que segue:

a) 2025: 9,83% (nove inteiros e oitenta e três centésimos por cento) da RLIT;

b) 2026: 10,68% (dez inteiros e sessenta e oito centésimos por cento) da RLIT;

c) 2027: 11,01% (onze inteiros e um centésimo por cento) da RLIT;

d) 2028: 11,35% (onze inteiros e trinta e cinco centésimos por cento) da RLIT;

e) 2029: 11,67% (onze inteiros e sessenta e sete centésimos por cento) da RLIT; e

f) 2030: 12,05% (doze inteiros e cinco centésimos por cento) da RLIT.

 Considerando que as partes poderão, de comum acordo, repactuar a redução dos percentuais previstos na tabela de implemento percentual de investimentos em saúde acima colacionado, sendo tal ato condicionado à demonstração pelo Estado, de situação financeira e fiscal mais desfavorável do que a projetada por ocasião do termo de autocomposição, o que traz ainda mais insegurança jurídica quanto a eficácia do acordo, que por si só é prejudicial ao usuário do SUS.

Considerando que os acordantes pactuam que os recursos que deveriam ter sido destinados a ações e serviços públicos de saúde, relativos aos anos de 2000, 2001, 2002, 2004, 2005, 2007, 2008, 2009, 2010, 2011. 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018, 2019, 2020, 2021, 2022, 2023 e 2024, mas que tenham sido utilizados pelo Estado para o pagamento de saneamento público, contribuições ao Sistema IPE-Saúde, contribuição patronal de pensionistas e inativos, despesas com o Hospital da Brigada Militar, cobertura do déficit de pensões e inativos, não serão ressarcidos ou complementados pelo Ente Público, tendo em vista encontrar—se o Estado em situação de recuperação fiscal, conforme descrito no acordo; Ou seja, admite-se o inadimplemento e desatenção à Constituição Federal e as legislações que a regulamentam, nos últimos 24 anos e o órgão que deveria fiscalizar o cumprimento da lei, chancela seu não atendimento.

Considerando que o Ministério Público possui a prerrogativa de custus leges, e deveria exigir a imediata conformidade com a lei, em defesa dos direitos alienáveis no que tange aos direitos sociais e notadamente o direito fundamental à saúde;

Considerando que ao firmar o termo de autocomposição, constata-se que:

1. Há um reconhecimento formal da ilegalidade, haja vista que o próprio instrumento admite que o Estado vinha descumprindo a obrigação legal de investir o percentual mínimo na saúde, desde o ano de 2000.

2. Há uma tolerância negociada ao descumprimento, haja vista que, ao estabelecer prazos e condições, concede-se mais tempo ao ente público para cumprir um dever legal que já era de execução imediata.

3. Verifica-se um desvio da função do Ministério Público, ou seja, o ente ministerial, que deveria exigir o cumprimento imediato e responsabilizar os gestores, passa a atuar como mediador de uma irregularidade, enfraquecendo a efetividade da norma.

Considerando que o Conselho Estadual de Saúde, desde a publicação da Emenda Constitucional n. 29 no ano de 2000, e também a partir do ano de 2012, quando da vigência da Lei Complementar n. 141/2012, que regulamenta o texto constitucional, tem exigido o cumprimento imediato da aplicação do mínimo constitucional na área da saúde.

Considerando que o descumprimento histórico do Estado do Rio Grande do Sul teve como consequência a reprovação dos Relatórios Anuais de Gestão – RAGs, desde o ano de 2000 até 2023 (o ano de 2024 ainda está em análise pelo CES/RS).

Considerando que o não cumprimento da Lei Complementar n. 141/2012 faz com que o Estado deixe de aplicar bilhões de reais no Sistema Único de Saúde - SUS, causando grave desassistência à população, comprometendo o atendimento dos princípios basilares do SUS.

Considerando que o referido termo de autocomposição foi firmado sem a necessária apreciação do Conselho Estadual de Saúde, instância estadual de Controle Social, de caráter permanente e deliberativo, o que afronta a Lei Federal n. 8142/90.

Considerando que o mínimo constitucional não é meta futura nem promessa política, mas uma obrigação vinculada, de execução obrigatória e imediata. Transformar essa obrigação em objeto de acordo é relativizar a própria Constituição.

O CES/RS emite a presente MOÇÃO DE REPÚDIO contra o Termo de Autocomposição firmado, nos termos acordados, que posterga até o ano de 2030 uma obrigação de execução imediata, haja vista que o referido instrumento deixa de ser apenas uma ferramenta jurídica de defesa coletiva e passa a ser um registro formal de que governo e Ministério Público aceitaram negociar a aplicação de um direito fundamental indisponível, fragilizando a proteção da saúde pública e a força da lei, e pior, alheio à apreciação e deliberação desta instância de Controle Social do SUS. Ainda, traz insegurança jurídica quanto a resolutividade da medida, posto que prevê repactuação em caso de situação econômica desfavorável do Estado.

 

 Porto Alegre, 18 de agosto de 2025

Conselho Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul